O grande
responsável por esta obra é Albert Camus, que nasceu em 1913 e faleceu no ano e
1960; considerado um dos principais representantes do existencialismo francês,
influenciando de modo decisivo a visão de mundo da geração de intelectuais na
época pós-II Guerra mundial. Agraciado em 1957 com o prêmio Nobel de
Literatura.
O livro é dividido
em duas partes sendo subdivididas em capítulos que relata a trajetória de vida
de Meursault, um homem que assiste indiferente ao enterro da mãe; se relaciona
com uma mulher por nome Marie do qual vive um
romance e tem a sua vida transformada ao fazer amizade com o senhor
Raymond, pois cometera um assassinato, numa trama de vingança amorosa em uma
história que lhe era inteiramente alheia.
obra é tão bem elaborada, que em determinados
momentos faz com que o leitor, se torne um personagem ativo da história, cada capítulo se inicia
como as páginas de um diário, escritas no tempo presente. Inicialmente relata
sobre o trajeto que fizera até o asilo, para participar da cerimônia fúnebre de
sua mãe, que ainda em vida manifestara o desejo de que fosse realizada uma
cerimônia religiosa em seu funeral, algo desinteressante para Meursault, que
declarara em outras oportunidades não acreditar na existência de Deus.
Uma pergunta
inquietante percorre toda a trama. Porquê Meursault, colocara sua mãe em um
asilo? E porque não a visitara por longos anos? Porque se tornara tão
insensível a ponto de não querer ver sua mãe dentro de um caixão? Perguntas
como essas seriam determinantes para serem expostas no dia de seu julgamento.
O personagem
principal é apresentado como uma pessoa bem observadora e reflexiva, onde
nenhum detalhe passava despercebido por seus olhos, em fim, uma pessoa
misteriosa. Quando se ausenta no trabalho não compreende o motivo da
insatisfação de seu patrão, somente depois, percebe ou se da conta do universo
em que esta inserido, que é o modo de produção capitalista; faltar ao trabalho,
ainda que por motivo “justo” significava uma grande perda de capital para o seu
patrão. Após o enterro da mãe é revelado um Meursault, pensativo e ao mesmo
tempo entediado, ao observar as pessoas caminhando pelas ruas e a forma como se
comportavam nos espaços públicos, nos fazendo lembrar de Maria Stella
Bresciani, com um olhar semelhante ao descrever Londres e Paris no século XIX,
deixando claro como o capitalismo interferia diretamente no cotidiano das
pessoas, uma vez que o relógio passou a ser disciplinador do comportamento e
rotina do homem.
Diante do
sentimento alheio, sente dificuldades em demonstrar os seus. Não é ambicioso e
quando recebe a proposta de mudar para Paris, para ser um representante
comercial, mais uma vez surpreende o leitor ao recusar ao convite, uma decisão
atípica para quem estava inserido no capitalismo. Diante dos acontecimentos
surge um personagem enigmático; o senhor Salamano, um homem que desperta a
curiosidade tanto pelos personagens da história, quanto pelos leitores desta
excelente obra.
A segunda parte do
livro direciona o foco da narrativa, para o episódio que mudaria
definitivamente a história de Meursault. Todos esses acontecimentos se iniciam
quando ele conhece o senhor Raymond, esta mudança se da de forma negativa; que
podem ser dividida em três etapas:
Primeiro, porque serviria de testemunha para seu “amigo”, que espancara
uma mulher; segundo por ter a sua segurança ameaçada por alguns árabes, que
eram amigos ou conhecidos da mulher agredida. E no momento em que Meursault,
começa ver a vida com outra perspectiva, um pouco mais romântica e externar
melhor o seus sentimentos, acontece a terceira etapa, uma grande tragédia em
sua vida, matara um árabe nas areias da praia de Argel, “não” de forma
premeditada, mas atribuiu este acontecimento ao fato do excessivo calor e aos
raios solares, tirar-lhe aparentemente à lucidez.
Uma “amizade” que
não lhe trouxe nenhum benefício, pois o homem que morrera, algumas horas antes
tinha entrado em vias de fato com seu amigo, chegando a cortar-lhe o braço com
uma faca, e agora nesta trama de vingança amorosa em uma história que lhe era
inteiramente alheia deflagra 5 tiros contra o homem. E assim as areias da praia
que estava moldando ou despertando um sentimento que Meursault não o conhecia,
o local onde estivera vivendo uma verdadeira história de amor se tornara um
local de tristeza, pois ali ele “compreendeu que destruíra o equilíbrio do dia,
o silêncio excepcional de uma praia, onde havia sido feliz” p.60.
A forma como os
personagens interagem com o leitor é incrível, pois nos sugere a existência de
um narrador oculto, e nesta precisão de detalhes, descreve minuciosamente todos
os detalhes do dia do julgamento, onde Meursault, percebendo a aproximação
deste grande dia , se enche de expectativas quanto a sua saída da prisão. Ao
chegar ao tribunal, tem uma grande surpresa ao ver a grande quantidade de
pessoas a lhe observar e ao perceber que o seu nome se tornara bem conhecido em
toda cidade, fruto das freqüentes publicações dos jornais noticiando o caso.
A forma como é
descrito a personalidade do senhor Meursault impressiona, a isto atribui-se ao
enorme rigor estilístico de Camus, com a sua “atenção obsessiva para que nada
escape ao movimento da escrita” Meursault, mesmo dentro da prisão mantém uma
posição de distanciamento, como se não soubesse da gravidade e proporção do
motivo de estar ali sendo julgado. A principal estratégia traçada pela
acusação, estava relacionada à convivência e aos acontecimentos ocorridos
durante e após o funeral de sua mãe, onde os representantes da lei, queriam
estabelecer relações de causa e efeito entre suas atitudes pregressas. E a
principal questão levantada foi: Como um homem pode ser tão insensível diante
de tal situação? Porque se comportara tão inadequadamente diante das
circunstâncias?
Em fim, após um
exaustivo julgamento, entre acaloradas discussões entre acusação e defesa o
júri chegou a uma conclusão: Meursault era “culpado do crime”...
“premeditação”... “circunstâncias atenuantes” e a punição para isso deveria
ser; morte por decapitação em praça pública em nome do povo francês. E assim
conclui a obra mostrando o senhor Meursault, confuso e bem reflexivo, um homem
que fizera uma retrospectiva de sua vida chegando a conclusão que a morte mais
cedo ou mais tarde, chega para todos, e como um verdadeiro “herói”, não fugiu
nem se desviou de seus princípios, e esvaziado de esperança, percebera que não
poderia fazer mais nada, aceitando assim a sua sentença.
O período em que O
estrangeiro fora publicado (1942) é marcado por uma época de muita tensão e
conflito mundial, principalmente na Europa, que vivia os terríveis dias da II
grande Guerra Mundial. Seu pai fora morto na Batalha do Marne, 1914 (I Guerra
Mundial) e ainda jovem filiou-se ao Partido Comunista. Mas a grande questão é:
O que tudo isso tem a ver com as análises dos textos e com as discussões feitas
em sala de aula?
Analisando esta
obra (O estrangeiro) percebemos uma grande relação com o tema deste componente
curricular estudado ao longo deste semestre, do qual podemos citar A revolução
Mundial, extraída da conhecidíssima obra de Eric Hobsbawn; A Era dos Extremos,
que afirma que a Revolução Russa produziu um dos maiores acontecimentos
revolucionários da história moderna. Embora não percebemos uma discussão,
voltada para o quesito “terras”, identificamos elementos no livro que nos fazem
lembrar das discussões. O simples fato de Camus criticar ao capitalismo
ocidental é suficiente para entendermos o porque do senhor Meursault não ficar entusiasmado com a idéia
de ser um “representante comercial” na França, mostra de forma implícita o
descontentamento com aquele modo de produção, deixando nas entre linhas que
aquele modelo, no momento não se mostrava tão eficiente.
Toda a revolta e
insatisfação de Meursault, o não reconhecimento das regras sociais, o
estabelecimento por si próprio de uma ética social distanciada e o fato de não
se importar com as conseqüência de suas ações, nos fazem inevitavelmente
fazermos conexões com a Revolução Russa, visto que, para Marx o capitalismo é
extremamente desumano. Este capitalismo desumano pode ser representado na
figura do júri que acaba lhes tirando as expectativas de dias melhores. Assim é
o capitalismo, aqueles que não conseguem se enquadrar, as normas, condutas e
valores exigidos pela sociedade acabam da mesma forma.
Por fim o júri
acaba condenando-o a morte por encontrarem nele, algo de intolerante,
insensível e desumano na ótica daquela sociedade e o indivíduo que não fizesse
parte daquelas normas representava uma grande “ameaça” e deveria ser
silenciado.
Ouso a citar o
pedido feito pelo advogado de acusação de Meursault. “Peço-vos a cabeça deste
homem. E é sem escrúpulos que vos dirijo este pedido” este pedido que ora seria
atendido é uma espécie de sentença ao socialismo, que surgiu com grande força,
andando na contra mão da lógica capitalista, apresentando uma nova forma de ver
o mundo, mas que ao final foi silenciada. Porém assim como O estrangeiro, tem
se tornado um das maiores obras do século XX, e como o senhor Meursault,
manteve a sua posição de ver o mundo intacta, desta forma continua sendo o
socialismo, considerado por muitos derrotado, mas que ainda no século XXI
continua ressoando as suas idéias por todos os “cantos” do planeta.
Referência:
O estrangeiro/ Albert Camus; tradução de Valerie Rumjanek. – Rio de Janeiro: BestBolso,
2010.
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